Ainda meio atarantado com a mudança de hora, saí de casa dos meus pais, na praia da Madalena, e pedalei até à Câmara Municipal de Gaia, onde nos encontraríamos. Aquele primeiro trecho a subir serviu sobretudo para um teste e aquecimento às pernas. Admirado por ter chegado ao local marcado antes dele, restou-me esperar e arrefecer por uns dez minutos, até que ele lá apareceu e juntos escalamos os restantes e íngremes metros da Avenida da Republica para virar-mos à esquerda. Eram as tais primeiras horas da manhã, a estrada nacional 222 estava calma, perfeita para um ritmo de passeio e para uma conversa. O Rui acabou por ceder à minha insistência e lá revelou que uma súbita indisposição intestinal tinha sido a razão do seu atraso. Ahhh, tu tavas era todo borradinho, foi o que foi, gracejei com ele e seguimos tranquilos.
A temperatura não era muito baixa, a estrada estava húmida e volta e meia sentia-se um ventinho agreste de frente, mas com o esforço das subidas não sentíamos frio! Vencida a segunda mini-montanha do dia, e já depois do Parque Biológico, descemos satisfeitos e sem problemas de maior a não ser um grande alívio pelo desgaste natural de quem tem faltado aos treinos. Depois de outra subida, seguia-se mais outra descida, até surgir a mais longa e desgastante escalada até ao topo. Ainda que não esteja ao alcance do leitor, é difícil narrar com fidelidade toda a gama de sensações, odores, calores, tremores e suores frios por que passamos quando descíamos a uns alucinantes 80 km/h aqueles 4 quilómetros em direcção a Crestuma/Lever. Restava ainda uma curta subida e respectiva descida até à Barragem e estava ultrapassada a última dificuldade do dia. Num instante circulávamos já na margem oposta pela estrada marginal ao Rio Douro, a nacional 108, de regresso a casa. Mais à frente juntámo-nos a um pequeno pelotão de entusiastas das pedaladas como nós e, par a par, à conversa seguimos viagem contemplando a magnífica paisagem. Íamos fazendo uma curva mais apertada quando me aproximei do ciclista que se esforçava à minha frente. Cumprimento-o e felicito-o pela boa forma e levo como reposta uma gargalhada e a garantia que não serão os seus 72 anos a fazê-lo parar. Na rotunda do Freixo separámo-nos do grupo. À entrada da ponte Luis I despedi-me do Rui e só parei no Cais de Gaia para um gole de água. Se bem que já estava na hora de voltar, ainda resolvi repousar um pouco e curtir a paisagem do velho casario. Solitário e vitorioso, fiz a derradeira etapa na maior das calmas, na companhia de um Douro barrento e de um mar revolto. Cheguei a casa com 60 Km pedalados, muito feliz e ainda com todo um domingo pela frente. Hoje o meu corpo ressente-se, dorido, o que me leva a recordar e a contar esta epopeia ciclista com satisfação.
Boa semana.