quarta-feira, setembro 29

pois, pois...

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Hoje, e enquanto almoçava no restaurante, lá ia espreitando o televisor a cada garfada no prato do dia. Sintonizado na RTP, o Jornal da Tarde exibia em modo mute, ou seja, completamente mudo, imagens que ilustravam as notícias nacionais e do estrangeiro. À distância, a minha boa visão permitia-me ler as legendas que apareciam em roda pé e daí veio o mote para eu escrever este texto: Protesto, em protesto, protestar. Os poucos minutos de transmissão a que assisti deram para facilmente prever o tsunami de manifestações, greves e convulsões que por aí vem, contra as medidas de austeridade, o desemprego, contra as injustiças sociais praticadas pelo sistema político, bancário e desagradado pelo sistema judicial. Protestar é um direito do cidadão e, do meu posto de observação, solidarizo-me nos argumentos em defesa dos injustiçados. Mas atenção, muita atenção à forma como se protesta. Infelizmente os limites do bom senso e da calma são quase sempre absurdamente extravasados. Deve-se protestar sim mas com inteligência, sensatez e sobretudo sem perder e partir cabeças. Se o povo diz que “com o direito do teu lado nunca receies dar brado”, antes de mais deveriam-se ter em conta os deveres de cidadão, ou afinal o que se perde é toda a razão.


segunda-feira, setembro 27

pelas ruas do Porto

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Há a Foz, a Casa da Música, há Serralves, o Parque da Cidade, a Ribeira, mas o Porto tem muito mais para oferecer. Sou um fã incondicional do Porto mas eu sou suspeito. Aqui nasci, aqui trabalho e moro desde há alguns anos. É na mistura dos tempos que esta cidade me inspira, ou melhor, se inspira. É nela que respira a gente que aqui habita e que faz sentir a quem o visita quase como se sentisse em casa. É nas ruas da cidade que vive o pulsar do Porto. Uma dessas ruas é a Rua Miguel Bombarda onde as galerias de arte são o seu grande pólo de atracção. A sua história tem muitos anos e começou quando os marchands começaram a localizar aí as suas actividades. Depois chegaram os artistas e as lojas alternativas. O edifício Artes em Partes é uma espécie de centro comercial alternativo com projectos interessantes onde as pessoas se cruzam para alternar o estilo. Na Rua do Rosário, que a cruza, há outras coisas para ver e um dos melhores hotéis da cidade, o Hotel das Artes, que é também um complemento à oferta cultural do bairro. Dali até à Rua de Cedofeita é um pulinho e nem dá para aqui descrever o bulício que ali se vive. A noite é sem dúvida coisa a não perder na Invicta, e quando aperta a fome, no quarteirão entre a Igreja do Carmo e o Jardim da Cordoaria, pode-se encontrar uma grande variedade e oferta. As refeições são simples, na elaboração e na combinação de sabores, e uma introdução progressiva à gastronomia tripeira. Na praça em frente ao Café Piolho, nas Ruas Galerias de Paris e Cândido dos Reis, são um antro de animação, boa disposição e convívio, sempre de copo na mão. E a pé, até onde for possível, pode-se caminhar e conhecer ruas soturnas, monumentos e locais de história. Com o dia e o sol a despontar nada melhor do que acordar saboreando um aromático café de saco acompanhado de um croissant ou de uma torrada bijou no Café Progresso.

Não há melhor forma de dizer
bom dia.

(no Dia Mundial do Turismo)


sexta-feira, setembro 24

no bosque

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Cada uma das árvores parece existir só para si, de troncos voltados, umas para as outras. O Ulmeiro, largo e masculino, mostra-se indiferente aos arrufos do Choupo e, enquanto este se melindra de vez, despe-se lentamente das suas folhas finas e amareladas. Por sua vez, o Carvalho, longo e distanciado, recorda ao Sobreiro, brincalhão e de sombra aberta, que deixe de ser tão persistente e convencido. Vais ver que pró ano ficas sem casca. Pendendo para a direita, o Ulmeiro do cimo da sua copa, vê a terra cobrir-se de uma magia de diorama pela cor inédita dos ocres do manto de folhas espalhadas no chão. Mais abaixo, o jovem Pinheiro Manso parece um catraio com um qualquer tique nervoso. Bolotas! A Azinheira, volumosa e alta, observa-os arregalada, com a rosácea aberta, enquanto lança sem discrição um olhar de soslaio, sobretudo sobre aquelas duas velhas que coscuvilham lá no alto das suas despidas copas, tagarelando sobre tudo e sobre todos. Que velhas caducas, pssss…

E eu? Eu pego na minha bicicleta e vou dar uma voltinha, antes que arrefeça o tempo...


quarta-feira, setembro 22

área metro... politana

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Hoje é dia do ignorado dia mundial sem carros. Nada mais utópico imaginar-se uma estrada, uma rua desta cidade vazia de automóveis a meio da semana. Um dos principais problemas das cidades é a mobilidade, o tempo perdido no trânsito e o quanto a escassez de transportes urbanos afecta a vida das pessoas. De há muito a esta parte que optei pelos transportes públicos para chegar ao meu local de trabalho, no centro da cidade. O metro, o autocarro e até a bicicleta são a minha independência face ao empecilho que é circular e estacionar a viatura! Há dias li no jornal sobre o bom ritmo a que vão as obras do metro na futura linha de Gondomar e lembrei-me de um velho e típico amigo, que usava no meu dia-a-dia, e que não sei porquê veio a desaparecer. Lembrei-me dos tempos em que invadia o Porto de troleicarro. Do longo caminho que percorria a pé, de casa até ao Alto de Soutelo, para esperar por eles, para os ver passar, parar e entrar naqueles autocarros estranhos. Primeiro eram os “pantufas”, pequenos carros eléctricos que a população assim apelidou por serem tão silenciosos. Anos mais tarde chegaram os italianos, de um e de dois pisos, que deslizaram pelas linhas electrificadas das ruas da cidade durante muitos e bons anos. Estes eram mais modernos mas um bocadinho barulhentos, principalmente quando o compressor funcionava, para não falar do característico ruído do travão de mão, conhecido pelo "réque-réque", que só travava realmente após a quarta ou a quinta puxadela!



Provenientes de S. Pedro da Cova e de Gondomar, as carreiras 11 e 12 serviam no transporte colectivo em direcção ao Porto, até ao Bolhão. Levavam-me para todo o lado, à baixa, ao cinema, às aulas, à namorada, à praia, ao trabalho, e eu que sempre viajava com cara de sono. Chegava quase sempre apinhado de caretas mal-humoradas a caminho dos empregos. A entrada fazia-se pela porta traseira do veículo, directo à “cozinha”, que se atropelava na ânsia de apanhar um lugar vago. Ninguém escapava ao “pica” que, entalado no seu cubículo apertado, conferia o passe ou obliterava os bilhetes. Eu subia sempre as escadas para o piso superior e ali, se houvesse lugar vago nos bancos da 1ª fila, sentia-me um privilegiado, mas a única vantagem era psicológica. O troleicarro andava sempre lento e muito atrasado, mas mesmo assim eu julgava triunfar sobre o tempo perdido. Talvez espiar os outros passageiros e transeuntes fosse a melhor das distracções. Ainda que fosse difícil alcançar as raias do tédio, com uma vista panorâmica sobre o reboliço urbano não era difícil para o comum passageiro, como eu, dormitar até babar! Refastelado nos desconfortáveis assentos de napa vermelha, eu observava o deslizar passivo do pachorrento veículo, preso aos cabos eléctricos, pelas ruas estreitas e atafulhadas de automóveis, de gente egoísta ao volante das suas obrigações, preocupada com o seu umbigo e com medo de perder a prioridade nos cruzamentos. Gente que provavelmente não se sente feliz com nada, que nunca tem tempo a perder, e cada vez há mais gente assim.



Estes amigos do ambiente transportavam passageiros carregados de compras da Rua de Santa Catarina e do Bolhão. Neles entravam aos magotes os alunos do Alexandre Nobre e do “Rainha”. No Bonfim subiam os que chegavam trazidos pelo comboio até Campanhã. Na Praça das Flores um grupo de operárias encarregava-se de trazer outra animação à viajem. Em S. Roque o solícito motorista aguardava uns minutinhos para que os passageiros fizessem o transbordo com o 88. E o metálico caixote cor de laranja baloiçava o caminho todo e muitas vezes rangia, até parado… “réque-réque réque-réque”, quando as varas se soltavam dos cabos. É claro que se perdiam preciosos minutos, mas quando temos de permanecer durante um certo período com outras pessoas dentro dos transportes públicos, a nossa disposição e capacidade de observação supera qualquer monotonia. Sobretudo à noite, quando não há o que ver pela janela, as pessoas são “obrigadas” a se vasculharem. Naquele alheamento natural, a distracção óbvia do jornal, do livro, do sono não é diferente aos que verifico nos dias de hoje. Agora há animosidade no ar, uma maior disputa por espaço, por dispersão. Uma necessidade absurda por evitar qualquer mínimo contacto com o passageiro vizinho. Recordando bem as faces das pessoas servidas pelo trolei das sete e meia, percebia-se que havia desconforto mas havia um notável sentimento de partilha, uma comunicação audível e sincera, onde os problemas da vida eram contados a rir e as cenas dos próximos capítulos da novela da vida surgiam com um "até amanhã se Deus quiser".


terça-feira, setembro 21

insónia

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Chegas na calada da noite, como quem não quer a coisa, e de mansinho vais despertando atenção, a cada sorriso, cada olhar, a cada palavra. E a cada noite que passa o fazes, nessa tua forma doce e calma com que falas e te revelas, cada vez mais. Vais entrando no mundo dos sonhos, sem pressas, e por lá permaneces a residir e a moldá-lo à tua imagem, à tua maneira. Essa tua maneira que cativa e tira o sono a qualquer um, e que a mim me prende de uma forma tão, tão, tão... ao sofá da sala!


quarta-feira, setembro 15

as vindimas

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Faziam-se mais ou menos por esta altura. As férias decorriam ainda, saborosamente grandes. O vento soprava quente e trazia o aroma de fruta madura que invadia as nossas narinas. À época, usavam-se métodos tradicionais de cultivo ainda hoje transmitidos como uma imagem bucólica e alegre da vida no campo. Nos meus tempos de juventude, vivi com satisfação todo o ritual de tarefas do campo, como a época das vindimas que ocupa ainda uma grande parte das minhas memórias. Vindimar era um processo de várias etapas, todas elas comportando muito esforço e dedicação: apanhar, transportar e pisar as uvas para depois delas se obter o néctar da vida imbuído de uma sã alegria. No final seguia-se a derradeira etapa de armazenar o vinho em grandes pipas de castanho ou carvalho. Todo o tempo que eu e o meu irmão passamos na aldeia dos nossos avós “bebemos” dessa experiência, dessa alegria. Mas, é claro, não havia trabalho do campo que não tivesse esforços e canseiras. Embora eu fosse um grande mandrião, percebi o quão gratificante era para todos trabalhar em longas jornadas, desde manhã bem cedo até altas horas da noite, num sacrifício sempre feito com bastante alegria, para depois receber a dádiva da terra. E o vinho sempre omnipresente. Em cada trago valorizava-se o trabalho antes dispendido para o produzir e para o trazer até ali, à caneca, ao alcance do copo e da boca.

Sobranceira à margem direita do Douro, a aldeia dos meus avós fica na banda oposta a Resende, onde existem muitas quintas de grande tradição vinícola, dos vinhos verdes ao americano, do moscatel à água-pé. O “Travessado” é uma pequena quinta de três campos em socalcos, ensolarados a maior parte do dia onde o meu avô produzia uma parte do vinho, para consumo próprio. Estão rodeados de ramadas de vides em latadas de ferro e arame assente em esteios de granito, nas bordas dos campos, sendo o restante espaço reservado a culturas como o milho, a batata, o feijão, hortaliças, árvores de fruto e outras culturas sazonais. Mal a uva ficava madura eu não perdia tempo para provar as do “americano”. Tirava um bago de um cacho, branco ou tinto, espremia-o entre os dedos e o miolo saltava doce para a minha boca, hummm… e depois também provava o resultado agradável e fresco da mistura de várias castas.

Chegada a altura das vindimas, as pessoas dividiam-se ao longo das ramadas e apanhavam as uvas, à mão, com ajuda de tesouras. Os cachos eram colocados em pequenos cestos de verga e depois vazados para as gigas, uns enormes cestos de vime. Para o necessário transporte das uvas, um trabalho bastante duro devido ao declive do terreno e aos caminhos íngremes, prontificavam-se sempre os homens mais jovens que carregavam as gigas às costas até ao lagar na loja da casa. Era um trabalho repetido várias vezes enquanto houvesse uva para transportar. À noite, já com o lagar cheio, toda a gente de calças arregaçadas até às coxas saltava lá para dentro, para a pisa das uvas, tarefa que normalmente durava muitas horas. Lembro-me bem que no final, mesmo depois de bem lavadas as pernas e os pés, a comichão era desesperante e durava pelos dias seguintes. Seguia-se a fermentação do mosto e a parte que eu muito apreciava, a prova do vinho doce, o sumo aromático e saboroso da uva. A matéria que sobrava, o bagaço, era prensada e tudo muito bem aproveitado. O vinho era então colocado nos pipos a decantar e fazia-se a água-pé, um vinho mais leve resultante da mistura com água, ainda antes da fermentação, e que é tradicional no final da esfolhada do milho e pelo São Martinho para acompanhar as castanhas. O meu avô produzia uma água-pé de estalar, com um sabor fresco e trago suave. Quando o bagaço já estava quase seco, era retirado às postas da presa e esfarelado em gigas, seguindo de seguida para os alambiques para se produzir a famosa aguardente de bagaço, o “mata-bicho”. Extraída que era toda a aguardente, depois de bem seco, o bagaço servia também para estrumar os campos.

Concluído todo este processo, lá mais para o final do ano, o ciclo do cultivo recomeçava com a época das podas e reparação das latadas e ramadas. Mais tarde o tratamento com sulfato e monda dos cachos novos. Mais tarde, quando já pintava o bago, adivinha-se já nova vindima para o final do Verão. O ciclo da vinha, da vindima e do vinho, que o meu avô Zé Pinto me ensinou e eu felizmente vivi no tempo da minha meninice.




(a minha mãe a vindimar)


terça-feira, setembro 14

antes que me esqueça...

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Sendo este meu blogue fiel companheiro, parecendo que não, é também uma criatura muito sensível. Completam-se hoje 4 anos sobre o dia em que eu, não tendo nada melhor para fazer, criei este comparsa de muitas tecladas e risadas. Ele, tal como eu, lá vai sobrevivendo uns postes melhor que outros, por minha culpa mais apagadinho ultimamente pois o tempo e a vontade não têm abundado no gabinete. De qualquer forma quero agradecer a cada um de vocês que nos acompanha por aqui e convido a todos que lhe cantem os parabéns.


segunda-feira, setembro 13

recomeçar?

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Tá bem... lá terá de ser, não é? Mas sem stresses, ó faxabôre!


sexta-feira, setembro 10

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"... cada pessoa é única e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa em nossa vida passa sozinha e não nos deixa só porque deixa um pouco de si e leva um pouquinho de nós..."

(frase retirada de uma citação de Charles Chaplin)


É só um até já, Tio Adriano.


quarta-feira, setembro 8

tia Carolina

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Saímos do Porto pela manhã cedo. Saindo da autoestrada em Amarante, subimos o Marão até ao Alto de Quintela, entrando no Concelho de Baião. Na descida, viramos para Santa Marinha do Zêzere e na estrada que vem do Marco tomamos a direcção do Peso da Régua. Abrandamos junto ao miradoiro dos Dízimos para apreciar o Douro, deslumbrante, que corria lá no fundo, emoldurado por vinhas e pomais. Lembro-me que era à entrada da freguesia de Frende, no Cruzeiro, que se saia para um caminho estreito e muito a descer. Agora seguimos pela estrada que começa junto à igreja, pelo meio de casas e oliveiras, para chegarmos à terra dos meus avós, ao Lugar do Castelo.

Tia Carolina é a primeira pessoa que nos dá as boas vindas. Sentada no chão à entrada da garagem, à fresquinha, para lá do portão da casa da minha tia Sílvia, faz entrançados com pequenas vergas de giesta, perfeitas e elegantes cestas, a arte que tem sido o seu modo de vida há mais de cinquenta anos. Olhó Paulinho! Bem vindo meu filho, dá cá um beijinho. Tia Carolina é das poucas pessoas que ainda se dedica a esta arte, que já vem do tempo dos seus avós... E se calhar ainda mais para trás... É uma arte muito antiga. Ahhh... fazer isto é tão fácil, depois da gente aprender não custa nada. Estão-se a rir, é ?!
Fazer uma cesta ou um açafate requer muito e duro trabalho. As verguinhas são de uma giesta especial, a piorna. É uma giesta brava que só se dá nas serras e, mesmo assim, não é em qualquer monte que se encontra. Antigamente, arranjar um molho de piorna era um martírio e a gente tinha de ir buscá-la à serra da Gralheira, na outra banda do Concelho de Resende, e às vezes também aos montes de Castro Daire. Ceávamos cedinho e, com uma navalha no bolso e o que houvesse para comer, juntavam-se grupos e partíamos por entre mato e caminhos de cabras, toda a noite a caminhar e a cantar até chegar à serra, ainda antes do amanhecer. Logo, logo, começávamos a cortar as giestas, as vergas finas e as mais grossinhas, que as atávamos em molhos, tudo feito com muito despacho não fossem aparecer os donos dos campos que as queriam para dar ao gado. Carregados com os molhos de giestas ás costas ou à cabeça, abalávamos ligeiros no caminho de regresso a casa, ainda mal o dia despontava. Depois, era um dia inteiro a caminhar, cansados e cheios de fome. Era tão longe! Tão longe que chegávamos a casa com os pés cheios de bolhas e derreadinhos de todo. Às vezes, enquanto descansávamos um pouquinho, aproveitávamos e ali mesmo esfolávamos as vergas, o que quer dizer, para lhes tirar a pele. Assim vínhamos mais leves. Mas não se pode colher vergas numa altura qualquer. Só se corta a piorna nos meses de Março e Abril, ou então em Julho ou Agosto. Tínhamos quatro meses para carregar vergas que dessem para todo o ano. Havia semanas que íamos duas e três vezes buscar as vergas à serra, mulheres e homens que alombavam com os carregos e toda a paciência para fazer cestinhas.


Assim que têm as giestas em casa, a primeira coisa a fazer é esfolá-las. Pega-se num pau, do tamanho de uma mão e racha-se ao meio, como quem racha uma cenoura. Mete-se a ponta da giesta no meio desse pau, aperta-se e puxa-se com firmeza. Quando a giesta sai, também a pele já saiu. As giestas piorno, mais resistentes que a giesta normal, são a matéria prima. Estende-se o miolo da giesta ao sol por uns dois, três dias, até ficarem bem secas e amarelinhas. Outro trabalho de paciência é depois escolher e separar as giestas conforme a grossura. As mais finas para um lado e as mais grossas para outro. Escolhidas que estão, começa-se então a arte de as entrelaçar. As mais finas servem para fazer as cestas pequenas e as mais grossas para os açafates. É preciso demolhar as giestas alguns minutos em água para que fiquem mais fáceis de trabalhar. Pega-se na navalha, a boa companheira para este ofício, e aparam-se as pontas. A primeira coisa que se faz é sempre o fundo. Depois é só enlear e gradear as giestas com os dedos até fazer o talho da cesta e finalmente pôr-lhe a asa. Tia Carolina fica ali sentada, à porta de casa ou à sombra do alpendre da churrasqueira, horas a fio agarrada ao trabalho. Pode à vontade acabar duas dúzias de cestinhas, ou então seis açafates num só dia. Diz que nunca houve falta de procura. Com a venda nunca a gente se preocupou. Antigamente vinham cá os negociantes que nos compravam toda a mercadoria que havia e ainda mais que houvesse. As cestinhas e os açafates vendem-se às dúzias. Nos dias d’ hoje tudo está mais facilitado. A Câmara (a Municipal de Baião através do Centro de Artesanato) empresta-nos a camioneta e o motorista para irmos colher a piorna à serra. Agora os donos já não se importam que a gente lá vá colher as giestas, e todo o trabalho que fazemos está já vendido por bom preço. Faz-me pena que cada vez menos gente queira aprender e se dedique a este trabalho. Quando eu, e outras como eu, largarem o trabalho, talvez isto acabe, o que me faz pena. Oxalá esteja enganada.

Tia, deixe-me felicitá-la por este seu dia de aniversário, estes seus 85 anos cheios de vitalidade e alegria. Agora vou só lá dentro cumprimentar a malta… Ãhhh! O quê meu filho!!! Ai, não fosse eu estar a ficar cada vez mais mouca…




terça-feira, setembro 7

postal da Praia da Rocha

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( ...que estava assim esta manhã)

Depois de uma curta temporada mais perto de casa, aqui estou eu novamente, dando continuidade ao blogue que ficou abandonado durante longos dias. Eu, que já estava a ficar acostumado a estar longe do computador, tenho sentido muita falta de ler e escrever, de comentar os assuntos que surgem do outro lado, e confesso que a disponibilidade da minha vontade era inviável à máquina. Mas não há nada melhor do que rever velhos amigos e distribuir sorrisos, só para dizer olá.

É uma sensação tranquilizadora observar o horizonte, e o tempo que faz por cá favorece toda a esta minha contemplação, porque o bom que fica destes dias é o gosto de chocolate menta e banho de praia até dizer chega! Aqui as águas bailam ao mesmo ritmo de passos distintos a cada nova valsa. Tenho a plena certeza que o convite feito era para mim e me incluía naquele compasso inebriante do vai e vem das ondas formadas. Só que alguns sentimentos me assaltavam a mente de preocupação e de vez em quando o vento dava uma leve palmadinha nas costas e me dizia “relaxa, está tudo bem”. É claro que está! Vou aproveitar os restantes dias de férias para refrescar a mente, pensar e repensar.

Vamos lá mãezinha, para uma boa recuperação tens que ter muita paciência. Um beijinho.