Fontinha: Escola da memória
A Escola da Fontinha é o máximo sinal de cidadania e de criação
possível, dentro de uma cidade. Cidade essa que parece que se abre para o
mundo. Mas a forma como hoje se atacou aquele espaço
é lamentável e derrota a esperança de todos aqueles que acreditaram na
possibilidade da criação de uma outra escola, a escola da Vida.
A falta de sensibilidade e de abertura para a criação de um diálogo
construtivo com a população da Fontinha foi desperdiçado, o que lá se
passava não se compra, não se encomenda, e o que produz no futuro é
incomensurável.
Desperdiçam-se energias e vocações de uma forma tão redutora que a única coisa que posso dizer é que estou triste.
E tristes estarão todos aqueles que fizeram daquele espaço um espaço
de fruição criativa, criação, ocupação de tempos livre e formação
contínua.
Tristes teremos de estar todos porque vivemos numa cidade maravilhosa
que não tem uma visão para um Futuro, que, sabemos, cada vez será mais
duro e difícil. Sabemos muitos que todas as formas informais de educação
deveriam ser muito bem-vindas. Mas quem está no Poder não sabe disso.
A qualidade de uma cidade é revelada pelos seus interstícios e não
pelas suas fachadas; é pela quantidade de espaços alternativos e pelo
tecido cultural heterogéneo que estes juntam que se faz de uma cidade um
espaço de memória.
Arriscamo-nos a perder a nossa!
Para sempre?
Mais um dia para recordar: o poder autoritário e economicista
calçou as botas e veio para a rua fazer uma demonstração de força. Mas
não é este desfile de moda, hoje tão banal, que torna o dia especial. O
que o torna especial é a carga simbólica que transmite e a prova de que o
fascismo anda a marchar pelo mundo.
Fechar escolas por falta de verbas é a desculpa recorrente daqueles
que doutrinam a austeridade, mas a verdade é que uma população educada
pode-se tornar inconveniente no dia em que começar a pensar.
Daí também a qualidade do ensino que existe ser cada vez mais fraca e
formatada – não interessa o que sonhamos, interessa o que vamos fazer
para ganhar dinheiro e para entrar no ‘mercado’.
Não interessa que saibam muito, apenas o suficiente para trabalhar
uma máquina. Não interessa que tenha um sentido, interessa o sentido.
Se assim não fosse, não havia motivos para fechar a Es.Col.A, um
projecto assente na solidariedade e no espírito comunitário, que decidiu
ocupar um edifício abandonado de uma antiga escola e começar a educar e
ocupar o tempo dos habitantes de um bairro esquecido no centro do
Porto, dando um sentido às suas vidas.
O espaço Es.Col.A será talvez dos projectos mais honestos que existem
em Portugal. Praticar o conhecimento e a educação desta forma só pode
conduzir as pessoas e a sociedade à verdade e à justiça. Exactamente
aquilo que não interessa existir quando se pratica a política do
fascismo, que só consegue sobreviver em mentes vazias.
Ao decidir encerrar um espaço destes, de ouvidos tapados e de forma
violenta, contra a vontade dos cidadãos daquele bairro, a autarquia do
Porto só vem provar que é o melhor exemplo disso em Portugal
continental.
À política da nulidade cultural (também adoptada pelo actual Governo)
e ao carácter economicista e anti-social (tão bem demonstrado no
processo do Aleixo), basta somar as políticas populistas e demagogas,
assentes no princípio ‘fachada limpa/alma vazia’, à atitude ressentida e
autista, personificada no carreirista político que é Rui Rio. Uma
miniatura daquilo que estamos a viver no país e no mundo.
E é esta a linguagem com que o Governo actual fala, é esta a
linguagem do poder internacional, sustentado no que gere valor
financeiro. Mais nenhum valor importa. A receita é essa – uma linguagem
austera, bruta e seca, mascarada de propaganda e demagogia, de uma
violência física e espiritual que conduz ao fim do conhecimento e por
sua vez ao fim da liberdade.
O simbolismo do dia de hoje é precisamente esse: assim como uma bota
que pisa uma face humana para sempre, como escreveu Orwell, hoje um
cassetete fechou uma escola. Para sempre?
A capacidade de sonhar permite a obra avançar!
O que hoje se passou na escola da Fontinha, com o despejo do
movimento Es.Col.A, é retirar a capacidade de sonhar e de concretizar a
quem diariamente luta por passar do sonho à obra-feita.
Os acontecimentos do dia de hoje ultrapassam em muito a capacidade de
entendimento de qualquer cidadão perante a atitude da Câmara Municipal
do Porto, ao acionar a ordem de despejo ao Movimento Es.Col.A.
Mas mais do que analisar, questionar e até julgar esta ação da CMP,
urge muito mais aprofundar as atitudes dos cidadãos que contestaram este
despejo. Foi visível a indignação sentida por todos, resultado da
profunda incompreensão por toda a situação.
Como poderiam eles ficar serenos quando lhes é retirado, de forma
violenta, parte do conforto emocional e imaterial que recebem desde
movimento, que de forma voluntária, lhes presta algumas atividades
pedagógicas e culturais?
Não podemos permitir que estes acontecimentos de violência e de falta
de respeito se repitam, não são estas as atitudes que fazem do Porto
uma cidade de “gente grande”. Grande na sua essência e que respeita
génese da cidade, que valoriza as suas gentes e reconhece as suas
capacidades…
Mais do que querer uma cidade reconhecida internacionalmente feita
para os turistas e para o turismo, é importante querer e manter a cidade
respeitada por todos os que dela fazem a sua cidade!
Porto24
Porto24
2 comentários:
A lei da bastonada voltou em força, com polícias que se queixam de agressões e injúrias da população, mas quando se vai a ver esta é que foi agredida e os tais elementos agressores e injuriosos eclipsaram-se, como por magia! Esta é a verdadeira face do fascismo, no seu pior... com Coelho e Rio a orquestrar! :P
Ca nojo!
Cá estamos nós em Portugal. Provavelmente vão repovoar as instalações com pessoas que vivem do rendimento minimo. Não que tenha nada contra quem vive do rendimento minimo mas é uma pena que uma iniciativa como esta se tenha perdido...
Abraços
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