segunda-feira, agosto 29

até já...

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estarei fora uns dias mas andarei por perto.

sábado, agosto 27

costuma-se dizer...

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Quando alguém resolve um problema que tem pela frente costuma-se dizer que… se viu grego;

Se uma coisa é extremamente difícil de compreender, ele afirma que… isso é chinês;

Quem mexe em alguma coisa que não queira que mexa… é como o espanhol;

Se vive com luxo e ostentação… vive à grande e à francesa;

Se tenta regatear o preço de alguma coisa… é pior que os marroquinos;

Mas quando algo corre mal ou alguém faz merda… é à portuguesa!


quinta-feira, agosto 25

portugal no seu melhor, versão bate-chapas.

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Existem muitos mitos relacionados com o trânsito, mas nenhum se generalizou tanto ao ponto de praticamente se tornar regra como no caso das colisões traseiras. Quando acontece de um carro abalroar a traseira de outro veículo, a primeira coisa que se ouve é que o culpado é sempre o infeliz que não conseguiu travar a tempo para evitar o acidente. "Quem bate por trás paga", é o que se ouve nessas situações. Anteontem à noite, aqui o infeliz era o segundo a aguardar o verde no semáforo. Ao sinal de partida, lentamente dá inicio à marcha, liga o pisca e segue o veículo da frente que também vira à direita. Num piscar de olhos dá conta que subitamente o carro da frente trava, bruscamente, devido à presença doutro veículo na mesma faixa e em sentido contrário, num estreitamento da Rua de Requesende, e... Aiii!.... Pummm... já está! Passado o choque e a inevitabilidade, restou alguma chapa amolgada e o preenchimento da declaração amigável (!!!). Para demonstrar as inteligentes soluções da engenharia urbana cá do burgo, ontem mesmo passei por lá e registei o local do embate para engrossar o rol de aberrações deste “Portugal no seu melhor!



(cruzamento da Alameda da Prelada, recentemente construida,
com a velhinha Rua de Requesende, no Porto)

terça-feira, agosto 23

era uma vez um computador ligado à rede

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Carlos permanecia à janela. Contemplava a vastidão do seu quarto de pensão e pensava naquilo que não via. Pega no computador e resolve publicar um texto no seu perfil, do que sentia naquele mesmo instante. Era um dia de semana, casual e igual a tantas outras tardes de chuva. Apenas em duas frases, Carlos revela um súbito pensamento, quase sem sentido, só para ficar ali, incógnito e desinteressante. Depois saiu do blogue e espreita o Gmail. Nada de novo. Volta para o deslumbre da janela do seu quarto. Vigia de soslaio o monitor e naquele instante algo lhe desperta a atenção. Alguém comentou o seu texto. O seu ignorado blogue, confidente de longa data, recebia um comentário, o primeiro comentário, coisa nunca antes vista. Era um comentário sagaz e bem humorado. Assinava Flor de Lótus e do lado direito, uma pequena fotografia a preto e branco compunha o avatar. O que poderia ser uma jovem sedutora, dona de um sorriso e olhar distintos era apenas uma flor. Carlos lê com atenção as poucas palavras que a decoram e entra curioso no perfil da sua visitante. Queria saber mais, queria conhecer melhor essa Flor de Lótus, mas o que encontra é escassa informação, apenas suficiente para perceber que também tem um blogue. Ele vai lá, busca saber mais nas entrelinhas sobre o que ela escreve, por onde gosta de se perder no labirinto da blogosfera. Espreita todos os detalhes das imagens, percebe o cariz feminino nos textos publicados. Um texto em particular é tanto do seu agrado que resolve comentar, deixando um sinal de apreço. Imediatamente, como se estivesse à espera, Flor de Lótus retribui de uma forma atenciosa, simpática, singular até. Carlos é um homem acostumado com o concreto, não se deslumbra com palavras meigas, mas crê que em algum lugar algo maior o espera. Desde esse dia passa a publicar todos os dias, várias vezes ao dia, tudo o que lhe passa pela cabeça, e dela recebe sempre uma palavra banal. As confidências são trocadas na intimidade dos e-mails e passam a conhecer-se melhor numa rotina como de mão dada num virtual passeio.

Este texto é todo ele virtual, fruto da imaginação e de uma conversa prévia. É um tema que não será de todo estranho pois é cada vez mais natural ouvir-se certos comentários e notícias sobre este novo tipo de relacionamento que acontece nas redes sociais. Será sinal ou uma forma de fugir à solidão, criando uma certa ilusão de que se encontram novos amigos, se é ouvido e se tem alguém com quem finalmente se pode conversar, mas que na realidade não passam de duas pessoas que embora se comunicando nunca antes se viram, olhos nos olhos. Os seus perfis podem perfeitamente ser fruto de uma falsidade, que é coisa tão comum e facilitada. Basta clicar e ter à disposição centenas de fotos que podem servir na perfeição para montar um interessante perfil, ou não. E na Internet são tantas as possibilidades quando a solidão aperta. Ali ninguém é feio, tem mau hálito ou é aproveitador. Ali só tem gente interessante, bonita, pessoas de bem que querem partilhar sem segundas intenções! Hummm... sabemos que não é bem assim, porque infelizmente há quem adopte essa prática não no sentido de partilhar mas de lucrar às custas da carência alheia. Uma vez que a presença física não é real, na internet o seguro morreu de velho e, quando a esmola é demais, o santo desconfia.

domingo, agosto 21

e já lá vão 17 anos!...

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As voltas que a vida dá! Parece que foi ontem que pela primeira vez o vi, ao colo do avô, com aqueles olhos negros arregalados, admirado, contemplando todo um mundo novo. Parabéns Rafa. Abraço do pai.

sexta-feira, agosto 19

o meu coração só tem uma cor: o azul e branco

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Não é apenas do F.C.Porto que eu gosto. O meu futebol é o futebol dos golos de calcanhar, dos penáltis falhados, dos saltos na bancada, das controvérsias ao intervalo. O meu futebol vive-se no estádio mais bonito do mundo, esfuziante e delirante nas goleadas, de espetar cinco secos no vencedor do campeonato anterior. Também das unhas roídas em angústia e, quando calha, contido q.b. nas derrotas. Vivem-se o futebol e a paixão em doses iguais e quando alguém nos pergunta se não é loucura isso do futebol nós erguemos bem alto as taças e citamos o grande capitão João Pinto: "Comigo, ou 'sem-migo', o Porto vai ser campeão!"

Hoje em dia, há demasiado negócio no futebol para o meu gosto. Eu preferia quando as crianças portuguesas jogavam futebol na rua, os nossos vagos candidatos a futebolistas demonstravam desde cedo a sua intimidade com a bola, cresciam e despontavam, faziam-se adultos jogadores abnegados, devotados ao clube que os singrava. Tais foram as dívidas que tivemos por cobrar a estes rapazes a quem demos a honra de vestir aquela linda camisola. Pois eu acho que agora valem pouco. É minha firme convicção de que metade disto começou a morrer no instante em que pela primeira vez se incorporou essa coisa da “indústria do futebol”. Dantes tratava-se de um jogo de homens, muitos falíveis e outros gloriosos. Em vez disso, o que temos é este futebol de autómatos do empresário manhoso. Um futebol de contracto e clausulas de rescisão, de movimentos bancários e cargas físicas, até porque o mais importante é o “encaixe financeiro”.

Por vontade dos dirigentes os treinadores não convocariam um só jogador lusitano, os seleccionadores nacionais das próximas gerações não terão outro remédio senão ir buscar nacionalizados para poder compor uma vaga lista de convocáveis. O público debandou das bancadas e, se ainda não debandou da televisão, foi por falta do que fazer. Afinal de contas, a própria têvê está há muito conluiada com essa absurda desumanização do jogo a que, à falta de melhor, demos o nome de “indústria”. No meu futebol continuará a caber a alegria do golo, o sentimento de injustiça e a matreirice do ponta-de-lança. No meu futebol cabem todas as vitórias e conquistas, e quero mais. A começar já esta noite, pelo jogo com o Gil Vicente.

quarta-feira, agosto 17

a Ribeira...

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... fervilha de gente que emborca fluidos debaixo da brisa fresca de Verão a acomodar o estio. Sorrisos e poses para máquinas fotográficas que passam de mão em mão. Os ares do rio douram as pedras e ecoam sons que ressoam nas arcadas. Há um certo misticismo na ambiência pouco lavada e cuidada das lages das labirínticas e estreitas ruas. Tudo parece um sonho em que ninguém te conhece mas alguém pode ousar meter conversa contigo. Podemos navegar no Douro nos seus muitos barcos de recreio e apreciar as suas margens repletas de turistas, de cor, de artistas, de movimento. Podemos passear a pé, admirando o casario colorido de roupas estendidas ao vento que assiste indiferente a tudo o que se passa. Podemos apreciar as várias bancas e lojas de artesanato abertas ao público com muitas peças artísticas de interesse. Podemos até descansar à sombra e degustar uma típica francesinha e um fino esperto numa das muitas esplanadas do cais. Saborear um cimbalino bem tirado e deliciar a vista acompanhado dum cálice de Porto. Sentir a história desta bela cidade tendo sempre a noção que ali algo de mágico pode acontecer.

sexta-feira, agosto 12

sede de viver

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Vivemos dias complicados, exaustivos, instintivos, em que cada qual procura seguir o seu rumo, sobrevivendo. É preciso procurar sorrisos, encontrar ânimo, o optimismo perdido de cada dia e entender porque permanecem fechadas certas portas. Mas o que ele procura apenas é matar a sede ou aliviar agora o calor que o atormenta para quando o frio chegar enrolar-se no pêlo crespo e com ele se aquecer. Mais sã é a água do regato ou da fonte, pois essa não está vedada e só se bebe da água que confia. Matar a solidão, matar a insensibilidade, quem o ajudaria desse desconforto? Oportuno, registo aquele instante e vadio numa sede de imaginação. Fluem imagens afortunadas de liberdade e aventura, mas é um sonho em vigília. Um sonho construtor, de um desejo vagabundo com que se traça o destino. Ou então deve ser o calor que me deixa tonto e me dá a sensação de estar no meio de um labirinto. O cão prossegue o seu caminho e eu volto para a minha sombra! Ah minha doce sombra, que delícia! Que boa companhia! Pronto, acho que já estou mais fortalecido. E assim, naquela tarde, num pequeno recanto de Vila Nova de Foz Côa, o meu devaneio inspirador se diluiu. Tenho sede.


quinta-feira, agosto 11

refinado prefiro o humor ou o açucar

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Há dias resolvi ir bolinar contra a nortada para Leça da Palmeira. A certa altura apeei-me das pedaladas para registar em imagem aquilo que considerei uma série de absurdas contradições. Uma notícia de hoje faz-me então rebuscar a foto e tirar as minhas conclusões.

Como se pode ver a tarde estava convidativa para pedalar. Encostei a bicla ao poste que segura um sinal azul, indicador do início de uma via reservada às bicicletas que do meu ponto de vista, e neste caso, não passa de uma extensão do passeio pedonal à beira mar plantado. Permiti que em primeiro plano ficasse um outro sinal, este de proibição, que julgo saber na teoria limita a velocidade dos veículos motorizados a 20 km/h. Quanto à prática já estamos conversados.

Primeira conclusão a reter: pedalar é mais veloz do que acelerar, até numa via que em princípio seria dedicada às bicicletas mas que têm de coabitar com outros seres e objectos.

Ao fundo vislumbra-se uma floresta de tubos de escape virados para o céu. Para quem não sabe pertencem a uma refinaria que motiva a notícia do dia e que alimenta a combustão de motores que, à partida, pois caso contrário estariam a infligir as regras de trânsito, não podem circular ali mais rápido que um corredor da maratona. A refinaria da petrogal, para além de empestar o ambiente, é uma bomba relógio pronta a explodir a qualquer momento. Em 2004 e a propósito de graves acidentes então surgidos com o pipeline que a liga às instalações do Porto de Leixões, surgiram notícias de que haveria a intenção de, a prazo, encerrar a refinaria. Parece que mais uma vez de boas intenções se encheu o inferno pois tudo permaneceu na mesma. Como sempre não se teve em conta as preocupações da população local, obrigada há décadas a viver com a espada oscilando em cima da sua cabeça devido aos riscos de acidente na refinaria. Ontem a população voltou a não ganhar para o susto com explosões audíveis e visíveis a vários quilómetros de distância. Dizem as más línguas que é obra do terrorista da Noruega!!! Agora fora de brincadeiras, nem é preciso relembrar o perigo que ela representa pois os inúmeros incidentes ao longo dos anos falam por si.

Em jeito de questão, a segunda conclusão a reter será: precisaremos assim tanto daquilo?


terça-feira, agosto 9

a título de desabafo

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(clicar na foto para ver melhor)


Ao que parece na madrugada do dia 27 de Fevereiro cometi uma infracção. E qual foi? Ter tido o desplante de utilizar os prestimosos serviços do pavimento do IC24, A41, CREP, ou lá o que lhe quiserem chamar, durante 2 km e tal para levar a minha esposa ao aeroporto, sem pagar. Não obstante tal abuso, parece que passados alguns minutos reincidi gravemente na mesma infracção, no sentido inverso, tentando regressar a casa para voltar a adormecer. Às vezes parece que ando mesmo a dormir na forma porque em nenhuma das ocasiões que utilizei a via detectei o que quer que fosse. Hoje recebi uma amável carta registada, certamente para despertar a minha consciência, dando-me conta que ascendi à categoria dos caloteiros desta simpática empresa que é a concessionária de auto-estradas “SCUT” e “ex-scut” que tem entre os seus valores de “responsabilidade social”: «contribuir para o despertar das consciências para questões que dizem respeito à sociedade em geral e que afectam cada um de nós.» (!!!). Fiquei assim a saber que, sem saber, na referida via existem pórticos electrónicos que nos espiam e nos cobram pela passagem, coisa que não se fez no momento e nas diversas formas de pagamento de portagens que conheço, que é a um portageiro. Ultimamente não tenho conduzido muito, e muito menos para os lados de Pedras Rubras, como tal não entendo a necessidade de adquirir e colar no pára-brisas uma dessas máquinas registadoras que a referida empresa comercializa. Nos termos da legislação que invocam (!) estou notificado a efectuar voluntariamente o pagamento do montante em dívida, sob pena de coimas que se podem multiplicar. Ao que parece devo-lhes a exorbitância de 20+20 cêntimos acrescidos de 2.29+2.29 euros de custos administrativos (!) que representam 900 e tal por cento do valor da portagem. Deve ser isto a que chamam “explorar de forma inovadora e diversificada o negócio de auto-estradas.”


Não vou dissertar agora o facto de que o Governo encapotado nestas empresas esteja a cobrar a utilização de uma via que foi construída com os nossos impostos e com as verbas provenientes da União Europeia, porque esse infelizmente é assunto extrapolado pelas leis abusivas deste país. O que irrita é viver num país que disponibiliza uma determinada estrutura que caso as queiramos utilizar somos obrigados a pagar (o chamado principio do utilizador/pagador), mas que depois inventam estas modas tecnológicas e não disponibilizam nenhum funcionário para receber atempadamente o que se deve no final da utilização desses serviços, não sendo necessária a deslocação aos balcões dos CTT’s, que os substitui na cobrança. Pois se não cobraram na devida altura foi porque não estavam presentes no respectivo local quando eu passei! Seria o chamado “não deixemos para amanhã o que podemos receber hoje”. Mas não, esta é a cultura do “gamanço” institucionalizada, a passos largos para a ditadura financeira. Por mais que insistam eu não vou comprar nenhum desses dispositivos de cobrança, vias verdes e quejandos que tais. Posso realmente fazer o pagamento “postecipado”, conforme me notificam agora, mas que essa verba diga respeito às parcelas dos custos das portagens e... Custos Administrativos! Mais de 900%!!!


Ahhh, e não precisam de me lembrar, “paga e não bufes!” porque já bufei...

sexta-feira, agosto 5

crónica do pedal a Santiago

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Três dias, cinco bicicletas, muitas mochilas, duas ladys e três ciclistas malucos: começava o “Plano Ciclístico até Santiago de Compostela” ou “Uma Trip do Carago”, como lhe preferiu chamar o tasqueiro. Poderia dizer que tínhamos resolvido finalmente fazer alguma coisa, que o nosso lado aventureiro falou mais alto que a preguiça que o cagaço e todas as outras desculpas (para cruzar os braços) juntas, mas a verdade é que mais alto o que falou mesmo foi a vontade de andar de bicicleta, da conversa fiada, de amigos que ficamos (já que eu pouco os conhecia), do tempo de ignorar o relógio, o telefone, a esposa e o filho, raras chances de ficar à toa por um caminho em nada aleatório. De chegar lá, afinal. Por alguma razão se desistiu mas nós fomos e vencemos, as subidas, as pedras, a sede, a lentidão. Nada que se pareça com aquela sensação que temos do objectivo alcançado. Não somos melhores nem piores, fomos capazes. Não quero c
onvencer ninguém a nada, nem dar palmadinhas nas nossas próprias costas. Quero mesmo é convidar todos a percorrer o mesmo caminho. Como foi? Incrível.

Engraçado que antes da viagem, descobri que existem perguntas padronizadas e que me foram feitas. Antes de mais nada vamos a elas e às suas respostas politicamente correctas:

1 – Vais pagar alguma promessa?


Não, decidi viajar de bicicleta por prazer, para experimentar novas sensações e conhecer pessoas e lugares.

2 – Quanto tempo de viagem?

O tempo é relativo. Sabe-se que na física t = d/v, ou seja, quanto maior a velocidade, menor o tempo, até mesmo porque a distância é uma constante, relativa mas é. Logo nosso plano foi cumprir parte do Caminho nos dois dias disponíveis. No primeiro de Viana até Redondela e no segundo até Compostela.

3 - Quantas horas de pedal?

Isso aí só saberíamos no dia (contas mal feitas à posteriori foram quase 20).

4 – E como voltarão?

De comboio, isto é, se nos deixarem colocar as bicicletas no porão da carruagem e se a CP mantiver a ligação de Vigo ao Porto.

5 – Vocês são loucos!

Sim, se querer viver e gozar dela é ser louco, então somos!

Vamos ao que interessa…

Então e por imperativos de agenda, tivemos que encurtar a viagem um dia. Assim, e parafraseando o tasqueiro, em vez de partirmos do Porto, decidimos partir de Viana, entrando no Caminho propriamente dito, em Tui.

Após uma curta noite de sono (a minha foi em claro) o despertador dispara, hora de levantar. Corpo ainda pesado pelo sono porém a alma eufórica pela novidade. Banhos tomados, estômagos forrados, hora de prender os últimos penduricalhos na bicla e partir no nevoeiro, cumprindo o trajecto num ritmo bem tranquilo entre Viana e Valença, paralelo ao mar e ao Rio Minho. Já em Cerveira haveríamos de fazer uma pausa em casa de um dos companheiros de route, para almoçar, refrescar e degustar meia melancia que já nos havia proporcionado boas risadas.

Demoramos a retornar à estrada e antes de chegar a Valença tivemos um ensaio da beleza e dureza do que iríamos encontrar em cima de uma bicicleta cheia de tralha. Despedimo-nos de terras lusas e entramos na Galiza, iniciando o Caminho propriamente dito pelas ruas íngremes e medievais de Tui. A minha bicicleta era agora um veículo internacional.

Podem crer, foi bom sentir o peso da bicla nos braços quando fui obrigado a descer as escadas e passar o pequeno túnel do Convento das Clarissas Enclausuradas. Depois o caminho passou a ser feito por belas trilhas rurais, bosques, pontes medievais, subidas e descidas por atalhos de pedra, gravilha e pó. Após sair de Porrinõ chegou a pior parte do Caminho, uma longa e feia recta que rasga uma horrível zona industrial. Neste ponto do percurso o grupo já se havia desagregado, porque a diferença de ritmos entre os bravos do pelotão e as majoretes era abismal.

Antes da alucinante descida para Redondela, onde iríamos pernoitar, tivemos o primeiro grande prémio de montanha, com um metro de língua para fora, e o milagre do dia. Após uma longa e extenuante subida que nos deixou de rastos, vários quilómetros percorridos mais a empurrar a bicla do que a pedalar, assim, no meio do nada, eis que surge o milagre. Não, não era uma visão, era mesmo real. À beira da estrada uma máquina de bebidas frescas esperava a nossa chegada que, à custa duns euritos, nos retribuiu com o justo prémio pelo nosso esforço. A chegada a Redondela fez-se já com as luzes ligadas, em velocidade e ferocidade. Fome saciada fomos dormir e repor um pouco das energias para encarar o dia seguinte que começaria bem cedo.

Com mais de 90 km nas pernas, saltamos da cama com uma disposição óptima para atacar muito cedo os 80 e tal que faltavam do Caminho. Trouxas arrumadas e amarradas depois de um reforçado, o objectivo passava por impor um ritmo mais forte do que o do dia anterior, portantos, combinamos que o grupo seguiria a dois ritmos diferentes, tendo como ponto de encontro Santiago, ou Vigo (onde iríamos dormir). Reinicia um sobe-desce sem fim, cansativo, porém recompensado com uma vista lindíssima que só quem está numa bicicleta pode parar, observar, ouvir os sons, sentir os cheiros e realmente experimentar cada sensação do momento. A Ria de Vigo, a Ilha de S. Simon, Árcade e a medieval Ponte de Sampayo, paisagens lindíssimas, povoados medievos de encantar e descidas perigosas.

Depois, bem, depois é que foram elas. “Estes Romanos eram mesmo loucos”, disso não tive dúvidas. Num dos bosques mais bonitos do caminho, de Canicouba até Briallos, a estrada romana deu-nos cabo do toutiço. Pedras enormes gastas pela erosão do tempo que não nos deram tréguas. Se as biclas já pesavam toneladas, então é que foram elas quando as tivemos de empurrar calçada acima e por bastante tempo. Depois as trilhas amenizaram um pouco o nosso esforço dando uma certa tranquilidade e um certo ar bucólico ao local. Encontramos muitos peregrinos que prosseguiam o Caminho a pé.

Mais tarde decidimos parar e forrar o estômago, tomando um pouco de humildade ao conviver com dois peregrinos oriundos da longínqua região de Natal, no Brasil.

Depois de um constante sube-sube, sígue-sígue, bendita a hora que avistamos a Taberna “O Muiño” à entrada da vila termal de Caldas de Reys. Era chegada a hora de atestar o depósito, deixar as bichas descansar e desenferrujar um pouco o portinhol.

"Precioso, ballé. Bem, e agora como é que me levanto!"

Mas o que tem se ser tem muita força e logo para recomeçar uma sequência de pedala um pouco, desce e empurra a bicicleta. Pedala mais um pouco e empurra novamente, e vai assim até ultrapassar esse obstáculo. Talvez esse trecho tenha sido o mais cansativo da viagem, fisicamente e emocionalmente. Fisicamente porque começa uma sequência de subidas e descidas, emocionalmente logo após uma subida descia um pouco automaticamente se ficava à espera quando viria outra subida.

Incrível era ver aquela plaquinha indicando o caminho e a distância remanescente, que renovava o ânimo no espírito, pois progredíamos e conseguiríamos ir até aonde nossos sonhos permitissem. Pausa para mais um descanso e algumas fotos.

"Falta pouco! Ufa!"

Eis que após mais alguns minutos de pedalada, finalmente chegamos ao nosso destino. Passo pela Porta da Faxeira que dá acesso à Rua do Franco onde o fervilhar de peregrinos e forasteiros circulam nas ruas entre tasquinhas e restaurantes com tapas de encher o olho. Calmamente circulamos no meio já com um ar de satisfação até que eu desmonto da “Etielbina” tiro os sapatos e ponho os pés de molho na Praça do Obradoiro repleta de gente.

O que ganhei com a viagem?

Momentos com amigos, momentos divertidos, convertidos. Experiências novas. Novos lugares, novas sensações. Vi e vivi que quando se quer se consegue. As dificuldades existem, como as que encontramos, o segredo é saber como lutar contra elas.

Existem caminhos que só se descobrem vivendo e eu segui pelo mesmo caminho. O proximo já vem a caminho. Até lá.